Barroso diz que política de drogas do Brasil é 'fiasco' e aborto não será pautado no STF agora
O ministro deu as declarações durante congresso online Macroday, do BTG Pactual

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto
Barroso, disse nesta segunda-feira, 6, que a política de drogas no Brasil é
"cheia de superstições" e um "fiasco", ao comentar o
julgamento sobre a descriminalização do porte de entorpecentes para consumo
pessoal. Ele também disse que o julgamento da ação que trata da
descriminalização do auto aborto, não entrará na pauta deste ano no Tribunal.
Barroso disse que, como presidente do STF, sua vontade
"é pautar tudo", mas que deixará a questão do aborto para 2024.
"A questão da interrupção da gestação que eu disse que não estava pensando
em pautar. Primeiro, para desanuviar o ambiente, segundo, porque é um debate
que precisa amadurecer na sociedade. (...) Ninguém é a favor do aborto. O que
estamos discutindo é se a mulher deve ou não ser presa", argumentou o
ministro.
O ministro deu as declarações durante congresso online
Macroday, do BTG Pactual. Os dois julgamentos que ele mencionou - sobre
descriminalização do auto aborto e das drogas para consumo pessoal - estão
parados.
"O Congresso já descriminalizou o porte (de drogas)
para consumo pessoal. O que o Supremo está fazendo é distinguir qual é a
quantidade que vai separar o porte pessoal de tráfico. Hoje em dia quem define
é a polícia, com critérios muitas vezes discriminatórios ou racializados. (...)
Tudo que envolve drogas envolve muitas superstições, a política de drogas é um
fiasco", disse o magistrado.
'A judicialização é um fato, o ativismo é uma lenda'
As discussões sobre aborto e drogas são um dos motes de uma
queda de braço entre o Supremo e o Congresso Nacional - há um incômodo dos
parlamentares com decisões da Corte sobre temas que, na sua perspectiva,
deveriam ser pacificados dentro do Legislativo.
A fala de Barroso desta segunda-feira apontou para uma
pacificação entre Judiciário e Legislativo - tom que ele tem adotado desde a
sua posse na presidência do STF. Ele defendeu que a Constituição "é
pacificadora" e disse que "não vê tensão entre os Poderes". O
ministro disse que no Brasil há um "preconceito contra a livre
iniciativa" e que existe compatibilidade entre agronegócio, defesa
ambiental e demarcação de terras indígenas.
O ministro refutou a prática de ativismo por parte da Corte
e culpou o excesso de judicialização no Brasil. Barroso disse que "todas
as questões" chegam ao Supremo e que seus membros são "atores
institucionais, e não políticos". Citando o dado do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ) de que há 81,4 milhões de processos judiciais no Brasil para seus
203 milhões de habitantes, Barroso disse que "a judicialização é um fato,
o ativismo é uma lenda".
Ele justificou que o Supremo estaria apenas cumprindo o que
determina a Constituição e disse que só haveria ativismo se estivesse agindo
sem ser provocado. "O constituinte retirou algumas matérias da política
ordinária, da vontade discricionária da política, e procurou trazê-la para a
racionalidade pública da Constituição e da interpretação constitucional."
Embate entre Congresso e Supremo resgata PECs que restringem
poder da Corte
O ponto mais crítico do atrito entre Congresso e Supremo foi
o marco temporal para demarcação das terras indígenas. O projeto de lei que o
estabelecia foi aprovado na Câmara com regime de urgência e, quando chegou ao
Senado, teve a promessa do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de que
a proposta ia ser aprovada criteriosamente
No entanto, antes que a tramitação fosse concluída, o STF
julgou a tese do marco temporal e julgou-a inconstitucional, esvaziando a
discussão no Congresso. O Senado reagiu aprovando o projeto de lei uma semana
depois - mas a proposta, vetada por Lula no dia 20 de outubro, já nasceu
"morta". Isso porque, se o veto for derrubado e ela se transformar em
lei, o Supremo deve declará-la inconstitucional também.
Além disso, há uma ofensiva no Congresso com a movimentação
de propostas de emenda à Constituição (PECs) que restringem os poderes do
Supremo. Uma delas, aprovada por unanimidade na Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) do Senado, veda decisões monocráticas que suspendam eficácia de
lei. A Corte toda precisaria votar para derrubar liminarmente uma lei que seja
inconstitucional.
Também foram ressuscitadas propostas de mandato para
ministros do Supremo, questão encampada pelo próprio presidente do Senado.
Gilmar Mendes refutou diretamente Pacheco, afirmando que o esforço dos
senadores era "comovente".
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